terça-feira, 14 de dezembro de 2010

O PODER DA ELITE NAS FACULDADES FEDERAIS

Por Mateus Prado:
Do Último Segundo
Nota de corte caiu porque a prova foi mais difícil e parte do conteúdo da 1ª fase só é visto em escolas tradicionais particulares
Como eu já havia previsto nesta coluna do IG Educaçãoas notas de corte da Fuvest 2011 caíram. A prova foi mais difícil, a concorrência diminuiu e as questões pareciam estar ali para selecionar somente para os cursos mais tradicionais e escolher um tipo bem específico de aluno. Era muito fácil prever que a nota de corte iria cair.
Posso dizer que, hoje, estão extremamente satisfeitas cerca de duas dezenas de escolas particulares tradicionais do Estado de São Paulo, por que a prova deste ano, mais do que nunca, foi feita quase que por encomenda para elas. Muitas das questões propostas pela prova tinham conteúdos que só são vistos nestes colégios. As outras milhares de escolas não chegam a esses conteúdos, e na verdade nem precisam chegar. Também devem estar satisfeitos os sistemas de ensino, que, em sua maioria, enchem os currículos de conteúdos e decorebas e impedem que o professor possa de fato ser um educador.
Notem que mais de 10 cursos tiveram 22 acertos como nota de corte. Para entender melhor o que isso significa, um aluno que soubesse resolver corretamente só sete das 89 questões e marcasse todas as demais em uma única alternativa teria uma nota maior que 22.
O que acontece é que boa parte de quem vai estudar na USP no próximo ano teve nota menor que 40% da prova na Fuvest (menos de 36 pontos). Isso mostra que alguns dos alunos que fazem a USP não são capazes de permanecer na vida universitária? A resposta é não. Do jeito que é o vestibular da USP, e neste ano mais que nos outros, ele não seleciona aqueles que são mais capazes de ter sucesso no ensino superior. Vários futuros alunos com nota baixa no vestibular de primeira fase que serão ótimos profissionais e um monte de alunos com nota alta que serão péssimos profissionais.
Isso acontece por que não há, hoje, nenhuma relação direta entre acertar questões conteudistas e ter a capacidade de compreender fenômenos, resolver problemas, fazer e implementar um projeto de vida e conviver de forma ética valorizando as diferenças e a diversidade.
O vestibular, por si só, é excludente. Ele parte da lógica de que existem mais candidatos do que vagas e por isto é necessário selecionar. A USP deste ano reforçou a função de ser, além de excludente, elitista.
Quando se escolhem as questões que estarão em uma prova, se escolhe o perfil de aluno que quer que entre na instituição. Que fique claro, isso não é somente a minha opinião. É o que tem dito o reitor da USP em suas entrevistas. Ou seja, a prova mais difícil, com suas questões conteudistas, não foi mera coincidência. Isso foi feito de forma planejada e articulada, para que o reitor encontrasse exatamente o aluno que ele quer.
Se o reitor quisesse alunos que conseguem conviver no ambiente universitário, não precisava fazer uma prova absurda como foi essa última da Fuvest. É muito mais importante saber as capacidades cognitivas, a resiliência - capacidade do indivíduo de lidar com problemas, superar obstáculos ou resistir à pressão de situações adversas - e a formação ética do candidato do que descobrir se ele sabe o que é "aliteração", "sinestesia" ou o "pretérito perfeito do indicativo".
Alguma coisa precisa ser feita para a USP se democratizar. O caminho, daquela que se orgulha de ser a melhor universidade da America Latina, tem sido o contrário. O vestibular, como vimos, foi totalmente contrário às reformas que os demais vestibulares do Brasil têm feito e extremamente distante do que há de mais moderno na educação. Foi feito para alguns colégios particulares e para as grandes redes de cursinhos.
Os poucos alunos da rede pública que furam este bloqueio já estão ameaçados, pois o reitor anunciou seu desejo de acabar com os cursos de menor concorrência. E para piorar, apesar de o orçamento da USP aumentar todos os anos (devido à vinculação orçamentária, que dá 9,57% do ICMS para as universidades públicas estaduais), o número de vagas na USP não aumenta na mesma proporção.


Além disso, fazem de tudo para acabar com o ENEM e o PROUNI.

Quem nasce em berço-de-ouro não gosta de pobre (salvo raras exceções).


Quem nasce na elite tem uma visão de mundo completamente fora do racional.


A educação é a arma e a base para inverter todos esses anos de retrocesso e estagnação.

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