sábado, 17 de setembro de 2011

O IPI para carros importados e o ponto de vista da elite



Por Fernando Brito
É discutível a questão dos benefícios ao consumidor e da concorrência entre as montadoras instaladas aqui – que mal ou bem geram emprego e, embora importando muito, movimentam a cadeia produtiva interna – mas a nossa imprensa parece estar tomada de um furor concorrencial quase bélico.
Tendo Miriam Leitão como “Joana D’Arc” (perdão, Joana), apelam à OMC para derrubar o “furor protecionista” de nosso Governo. É bom lembrar que, e muito corretamente, a propriedade de meios de comunicação no Brasil também tem seus mecanismos protecionistas, por outras razões. Econômicas ou culturais, as razões que um país tem para proteger-se são justas, se isso não implica exclusão total das influências ou produtos externos.
E não é que num destes areoubos internacionalistas, a Folha acaba apelando para um exemplo que desnuda todo o exagero com que o tema está sendo tratado? veja o que se publica sob o título Para gerente de loja de carros de luxo, governo “exagerou”:
A decisão do governo de elevar em 30 pontos percentuais o IPI para carros importados amargou o café de Breno Floriano, 32, gerente comercial de uma loja de veículos de luxo em Ribeirão Preto (303 km de São Paulo).
Segundo ele, o aumento do imposto vai encarecer em até R$ 300 mil os custos de importação de um veículo.
O Rolls Royce Phanton que acabou de comprar, por exemplo, vai custar R$ 1,309 milhão, ante os R$ 1,010 milhão previstos inicialmente.
Ribeirão Preto é reconhecida com um dos principais polos de consumo de carros de luxo do país. “Com esse custo a mais, vai ficar difícil vender carros importados. Acho que governo exagerou na medida”, disse.
Exagero, desculpe, é achar que o direito de comprar com imposto reduzido um Rolls-Royce Phanton de R$ 1 milhão deva se sobrepor aos interesses da economia nacional. Até porque quem quer este Maria Antonieta sobre rodas que está na foto do post, pode e deve pagar bastante imposto pelo seu luxo. Aliás, já paga, porque um gerente de loja ter um carro desses é sinal que a loja salga e muito no preço.
Se quer fazer economia, tem carro brasileiro para isso. Se quer ser esnobe, passe no caixa.

Rico não pode, sequer, ser investigado (PHA)

domingo, 11 de setembro de 2011

Os pobres e os pobres,cegos e surdos



Por Fernando Brito

Nos dias atrás, a revista inglesa, The Economist, mostrando com que país, cada estado brasileiro, tomado isoladamente, se parecia em matéria de Produto Interno Bruto, renda per capita e população. O resultado foi escandaloso.
Será que diante de contrastes tão gritantes, as nossas elites continuaram achando que este país pode ir em frente sem corrigir o que já não é nem mesmo um desequilíbrio, mas um ato, literalmente, de desamor ao próximo?
Sim, porque há gente que continua achando que o “zé povinho” das regiões atrasadas deste país pode continuar lá, largado, abandonado, sem que isto inviabilize a existência dos próprios centros desenvolvidos do Brasil?
Volta e meia, porém, este sentimento mesquinho e, sobretudo, burro, aflora nas páginas dos nossos jornais.
Outro dia mesmo, a Folha de S. Paulo tratou o fato de a economia nordestina estar crescendo a taxas superiores à média nacional como se isso fosse um simples arranjo político eleitoral do atual governo. Ora, se o Nordeste não crescer mais do que a média, como é que a desigualdade vai diminuir?
E é pouca, ainda, a vantagem que o Nordeste está tendo em relação às outras regiões. Publiquei, outro dia, o cálculo do IPEA de que, mesmo no ritmo atual, a renda média do nordestino só chegará a ser 75% da renda dos habitantes do sudeste no longínquo ano de 2074.
É uma cruel tradução estatística dos versos de João Cabral de Mello Neto, em Morte e Vida Severina, de que a cova é a “terra mais ancha que terás no mundo”.
Pobre gente. Muito mais pobre do que aqueles lá, que sofrem com o atraso e a pobreza. Pobre, porque perdeu a virtude humana do amor.
Pobre e cega, porque não vê que deixar milhões de seres humanos, ali, do seu lado, se degradarem na miséria é, sem nenhuma dúvida, condenarem a si mesmos a viver em um mundo selvagem.
Pobres, cegos e surdos. Porque nem mesmo conseguiu entender a lição poética de Antônio Carlos Jobim, de que é impossível ser feliz sozinho.