segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

A Líbia e o Petroleo



Por Helder Queiroz
A  atual crise política no mundo árabe já provoca sobressaltos no mercado internacional do petróleo. Após o agravamento da crise na Líbia, país integrante da OPEP e com produção de cerca de 1,5 milhões de barris, os preços internacionais do óleo bruto subiram de forma significativa, nos últimos dias, atingindo o patamar de US$ 108 para o barril do óleo do tipo Brent.
O grau de incerteza nos mercados e a consequente volatilidade dos preços tendem a ser ampliados nos próximos dias, dado que é praticamente impossível prever quais serão as consequências políticas e econômicas da crise na Líbia, mas sobretudo sobre eventuais desdobramentos em outros países da OPEP.
Desse modo, o maior receio dos agentes que operam nesse mercado diz respeito à possibilidade de ruptura da oferta. Nessas condições de incerteza, o mercado futuro do petróleo fica ainda mais ativo, multiplicando-se significativamente o número de transações, retroalimentando a tendência de alta. Esse aspecto não é particularmente novo. Em meados de 2008, os preços atingiram o patamar de US$ 145 e recuaram para praticamente a metade desse valor no final daquele ano.
Em que medida a alta de preços de 2008 se assemelha a essa que ocorre em 2011? Do ponto de vista dos fatores explicativos na verdade os dois movimentos são muito distintos: no primeiro caso, com forte predominância do componente estrutural; e no caso atual, os determinantes são de natureza geopolítica. Cabe recordar que, em 2008, a baixíssima capacidade excedente da produção mundial, em torno de 1 milhão de barris, suscitava fortes preocupações com relação à não adequação da oferta para atender a demanda, num contexto de crescimento econômico mundial. De certo modo, a crise financeira internacional contribuiu para “ resolver” este problema, devido à forte retração econômica ocorrida a partir do segundo semestre de 2008.
No caso do atual aumento de preços, a variável de natureza geopolítica é que se constituiu o principal fator de incerteza, o que leva os agentes econômicos a antecipar um eventual espraiamento da crise para outros países produtores de petróleo. Porém, é importante notar que a capacidade excedente de produção de petróleo, no mundo, é significativamente maior agora (em torno de  5 milhões de barris/dia). Apesar disso, a gravidade da crise no mundo árabe levou a aumentos significativos da cotação do petróleo.
Em comum, as últimas elevações dos preços internacionais registraram a importância de um componente de cunho financeiro, que se traduz na elevação do volume de contratos futuros comercializados. Num contexto de incerteza, seja por razões estruturais ou geopolíticas, os movimentos especulativos de curto prazo ampliam o volume de transações no mercado futuro, o que retroalimenta a tendência altista.
Não obstante o caráter especulativo dos movimentos de preços, é importante destacar que tal crise chega num péssimo momento para os países importadores de petróleo (principalmente os da Europa), em especial para aqueles que começavam a dar os primeiros passos na direção da recuperação econômica após a crise de 2008. Os custo mais elevados do petróleo tendem a gerar mais inflação e esfriar o processo de reaquecimento da economia. Em muitos países europeus, por exemplo, os governos preferem utilizar como instrumento a redução dos tributos incidentes sobre os preços dos combustíveis, atenuando o impacto sobre os preços finais dos derivados. Como ainda não foram concluídos os programas de ajuste fiscal, é difícil imaginar que, neste momento,  os governos usem os tradicionais instrumentos de amortecimento da elevação dos preços do petróleo, via a redução de uma  parcela da arrecadação dos tributos incidentes sobre os derivados de petróleo.
Caso a escalada de preços continue e contribua para frear a retomada do cresciimento econômico mundial, o Brasil, por um lado, irá arcar com uma possível redução de suas exportações para o países industrializados. Por outro lado, cabe lembrar que o país hoje se beneficia da independência energética vis-à-vis as importações de petróleo e está em vias de se tornar exportador líquido ao longo desta década.
Ademais, num cenário de preços elevados, a indústria petrolífera  contribui, de forma ainda mais significativa para o incremento do orçamento dos estados e municípios brasileiros beneficiários dos royalties e de outras participações governamentais do petróleo. A metodologia de cálculo do preço mínimo do petróleo produzido em campos brasileiros, que é tido como referência para o cálculo dos royalties, utiliza uma fórmula paramétrica que tem como referências o preço do petróleo tipo Brent.
Por fim, cabe notar que alterações significativas nesse quadro só surgirão com  a reversão de alguns dos fatores que têm desequilibrado a estrutura de oferta e demanda de petróleo ao longo dos últimos anos, bem como a redução da instabilidade geopolítica nos países integrantes da OPEP. Mas, no curto prazo, será difícil escapar de um contexto marcado por uma maior volatilidade dos preços de petróleo face à gravidade da crise observada, a qual obrigará a um redesenho das relações geopolíticas internacionais.

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