domingo, 11 de março de 2012

Reino Universal da Mercadoria

O primeiro desvio civilizacional que salta aos olhos é a mercantilização generalizada do humano.
 
O capitalismo instaurou o reino universal da mercadoria. Ao transformar a própria força de trabalho humano em mercadoria, esse sistema coisifica as pessoas e personifica as coisas. Mas o fato novo cada vez mais devastador é que nada de humano escapa à ditadura das finanças: tudo deve ser feito em função do lucro.

Nesse frenesi mercantil também figura outra tendência mortífera: a desvalorização tendencial de todos os valores. Kant formulou-a em termos morais: reconhecer dignidade ao ser humano é admitir que ele “não tem preço”; que tudo seja submetido a uma avaliação em termos de dinheiro institui uma falta de dignidade geral.

O preceito é verdadeiro não apenas no âmbito moral, mas também cognitivo, estético, jurídico: sem valores legítimos que atuem “por si mesmos e sem restrição”, não há mais humanidade civilizada. Esse drama é vivido cotidianamente: a verdade, o justo, o digno são alvos de depreciação e zombaria. 

A ditadura do rentável conspira para a morte do inestimável, do desinteressado, do gratuito. Estamos no limiar trágico de um mundo onde o ser humano não vale mais nada. 

Sobre essa involução, observa-se um terceiro elemento de gravidade capital: o incontrolável esvaziamento de sentido.

Involução nova, pois por muito tempo o capitalismo teve sentido: apesar de explorador, fez a humanidade progredir. Porém, com a irrupção da economia financeira, forma desumanizada e extrema da riqueza, entramos na era do nonsense universal: a acumulação de capital é cada vez mais sem fim nos dois sentidos da palavra fim.

A morte do sentido – propagada por todas as partes pelo curto prazo selvagem do retorno sobre o investimento – impede qualquer projeto humano de respirar. Essa é a razão pela qual a economia financeira é o fenômeno convulsivo de um “não mundo”, em que o absurdo tende a invadir tudo com seu comparsa, o fanatismo religioso.

E essa miopia estrutural se agudiza justamente quando as enormes potencialidades que o gênero humano começa a alcançar exigem a reflexão sobre o futuro.

Escapando de qualquer domínio coletivo, na carência colossal provocada pela substituição da democracia pela ordem do privado, nossas criações materiais e espirituais tornam-se forças cegas que subjugam e oprimem – alienação sem limites perante a qual qualquer G8 é insignificante. 

Daí esse sentimento compartilhado de uma humanidade sem piloto que se aproxima inexoravelmente do muro – muro ecológico, tanto quanto antropológico. Se o gênero humano começar a se degenerar, o Homo sapiens terá a mesma sorte. Estamos caminhando ladeira abaixo, prontos para acelerar.

(Não consegui identificar o autor)

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